A princípio, a resposta à pergunta acima pode parecer
muito simples. Afinal, o enorme e poderoso Boeing
747-400 consome cerca de 15 mil litros de querosene
de aviação por hora de voo, enquanto um Gol 1.6
lotado gastaria, no mesmo intervalo de tempo,
pouco mais de 8 litros de gasolina, rodando a 100 Km/h
em uma rodovia.
Todavia, a questão não é tão simples assim, pois temos
que considerar outras variáveis importantes. Afinal, enquanto
um Boeing 747-400 na sua configuração mais usual leva 416
passageiros, mais 20 tripulantes, um Gol 1.6 leva apenas 3
passageiros e um motorista. E devemos considerar também
que, se, em uma hora, um Gol roda 100 Km, um Boeing 747-400,
em voo de cruzeiro, voa aproximadamente 950 Km nesse
mesmo tempo.
Considerando essas variáveis, o cálculo começa a ficar
mais interessante, e a grande vantagem do Gol sobre
o 747 já começa a ficar discutível. Então, nós resolvemos
fazer um cálculo hipotético de uma viagem entre as
cidades de Guarulhos, em São Paulo, e Manaus,
para resolver a questão.
Para simplificar as coisas, resolvemos considerar
apenas velocidade e consumo de cruzeiro, para o
avião, e velocidade e consumo em rodovia, para
o carro. Afinal, se um avião vai consumir mais
e voar mais devagar na subida e nos circuitos de
tráfego, por exemplo, o carro também enfrentará
trechos urbanos em vários pontos da viagem, nos
quais sua velocidade também será menor e seu
consumo maior.
Outro ponto a ser considerado é a capacidade de
passageiros de cada um dos veículos.
Um Boeing 747-400 pode levar 524 passageiros
em duas classes, ou até mesmo 624 passageiros
em configuração doméstica (modelo 747-400D) mas,
na prática, a grande maioria dos aviões atualmente
em uso leva em média apenas 416, em três classes.
Então, vamos considerar um avião com 416 passageiros
a bordo, um 747-400 típico lotado.
Por sua vez, um Gol poderia levar quatro passageiros,
mais o motorista, mas, convenhamos, isso não seria
muito prático para uma viagem de quase 4.000 Km.
Então, vamos considerar um carro com apenas 3
passageiros. Então, temos um equilíbrio relativo entre
a capacidade de passageiros do avião e do carro.
As distâncias entre as duas cidades também varia,
conforme seja feita por via rodoviária ou por via aérea.
O avião, nesse caso, leva enorme vantagem, pois pode,
ao contrário do carro, seguir uma rota mais ou menos
direta.
Para o Boeing 747, consideramos uma rota por aerovias
superiores, em uma carta FPC -
Flight Planning Chart, em vigor a partir de 10 de março de 2011.
A aeronave voaria, então, 67 NM (Milhas Náuticas)
entre BCO (VOR Bonsucesso, em Guarulhos) até PCL
(Poços de Caldas, MG), 348 NM até Goiânia, na Aerovia
UL304, 278 NM de Goiânia até o fixo Teres, ainda na
Aerovia UL304, e depois 768 NM de Teres até Manaus,
na Aerovia UZ6. Considerando ainda umas 50 NM para
os procedimentos de saída , eventuais órbitas de
espera e aproximação, temos um total de 1511 NM de
distância, 2.798 Km.
Para o Gol, consideramos uma rota sugerida pelo Google Maps,
através de várias rodovias federais e estaduais, com os
maiores trechos situados na BR 364 (foto abaixo) até
Porto Velho, e BR 319 de Porto Velho até Manaus, num
total de 3.873 Km entre trechos de rodovia e urbanos,
mais de 1.000 Km mais longo que a rota por via aérea.
O Volkswagen Gol 1.6, que pode ser considerado um
típico automóvel brasileiro, consome cerca de 8,3 litros
de combustível a cada 100 Km rodados, considerando
um consumo médio de 12 Km/l em estrada, com 4 pessoas
a bordo mais bagagem, ou seja, muito pesado.
Considerando esse consumo, o Gol gastaria então 323 litros
de gasolina para ir de Guarulhos até Manaus,
um total de aproximadamente 108 litros de gasolina para
cada um dos três passageiros a bordo.
O Boeing 747-400, por sua vez, considerando-se um
consumo horário aproximado de 15.000 litros de querosene
por hora em cruzeiro no FL (Flight Level = Nível de Voo) 340
(35 mil pés), e uma velocidade de cruzeiro de Mach 0,86, a 50ºC
negativos de temperatura verdadeira do ar, vai
conseguir, aproximadamente, voar a 500 Knots (926 Km/h).
Considerando esses dados, veremos que o voo vai durar,
considerando a distância de 1511 NM, 3 horas e um minuto.
Como o consumo é 15.000 litros a cada 60 minutos, a
aeronave vai consumir um total de 45.250 litros
de querosene, aproximadamente 109 litros para cada
um dos 416 passageiros a bordo.
Então, a grande distância que separava o consumo
do Boeing 747 do consumo do Gol 1.6 já não é tão grande
assim. Deu um empate técnico, 108 litros de gasolina por
passageiro, para o Gol, contra 109 litros de querosene
por passageiro, para o Boeing 747, uma vantagem de
menos de um por cento para o carro.
Ainda que o Gol tenha, teoricamente, ganhado a
disputa, devemos considerar que o Gol, se mantivesse
uma velocidade média de 80 Km/h na estrada, alta
para os padrões das rodovias envolvidas, demoraria pelo
menos 48 horas e meia para chegar a Manaus, rodando
continuamente e sem considerar as paradas necessárias
para repouso e reabastecimento, enquanto o Boeing
faria a viagem em pouco mais de 3 horas de voo,
sem nenhuma parada.
Outra vantagem que o Boeing 747-400 teria sobre o Gol
é a sua imensa capacidade de carga. Além dos
passageiros e de suas bagagens, o 747 poderia levar muitas
toneladas que carga, que facilmente anulariam a ínfima
vantagem em favor do Gol, mesmo considerando que
o querosene de aviação custa 30 por cento a
mais que a gasolina automotiva, no Brasil.
O leitor deve ter em mente que todos esses
cálculos referem-se, unicamente, ao consumo de
combustível entre dois veículos totalmente diferentes,
não considerando, portanto, outros custos embutidos,
tanto na viagem por rodovia quanto na viagem por
via aérea, como tripulação, manutenção, tarifas
aeroportuárias, pedágios, refeiçoes e hospedagem.
Uma questão interessante, neste caso, é o impacto
ambiental provocado por ambos os meios de transporte.
Os aviões são acusados, frequentemente, de
provocar um impacto ambiental, proporcionalmente,
muito maior que o impacto provocado por outros
meios de transporte.
Como o impacto ambiental está diretamente
relacionado com o consumo de combustível,
podemos chegar á conclusão que isso não é verdade,
ou que, pelo menos, é altamente discutível.
Se é verdade que os aviões menores que o
747 consomem mais combustível por passageiro,
também é verdade que uma parcela considerável de
automóveis consome mais combustível que o Gol 1.6,
e muitas vezes levam apenas seu condutor a bordo,
a baixa velocidade e no trânsito urbano.